Quanto os seres humanos contaminam? Uma análise das emissões de CO2 das indústrias, veículos e lares

A cada ano, os seres humanos liberam uma quantidade cada vez maior de dióxido de carbono (CO2) para a atmosfera. Na atualidade, por volta de 40 bilhões de toneladas por ano. De acordo com o Observatório Terrestre da NASA, 8,4 bilhões de toneladas são decorrentes da queima de combustíveis fósseis – principalmente carvão, gás e petróleo. A Agência de Avaliação Ambiental dos Países Baixos e a Comissão Europeia enumeram os países mais contaminantes (inclusive a UE em seu conjunto e cada um de seus estados membros). São a China, os EUA, a UE, a Índia, a Rússia, o Japão, a Alemanha, o Canadá e o Brasil. Quando se mede em termos per capita, os EUA e o Canadá são os maiores culpados. Cada canadense e cada estadunidense emitem, em média, 15 toneladas de CO2 por ano (“pegada de carbono”). É o resultado dos deslocamentos, o consumo, o uso de energia doméstica, o ócio e as viagens.

O CO2 corresponde a aproximadamente 76% das emissões de gases de efeito estufa antropogênicos. A Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos afirma que a combustão (carbono, gás e petróleo) é a principal atividade humana que libera CO2. A produção elétrica, que utiliza a combustão de carbono para sua geração, representa 32,9% das emissões de CO2 dos Estados Unidos. O transporte representa 34,2%, que implica petróleo, já que a maioria do transporte (automóveis, caminhões, aviões e barcos) se baseiam no petróleo. A indústria é responsável por 15,4% das emissões e os lares/comércios por 10%.

Um barril contém 42 galões (159 litros) de petróleo. A cada dia, 96 milhões de barris de petróleo e combustíveis líquidos são consumidos em todo o mundo. Isso equivale a 35 bilhões de barris por ano. Os veículos são importantes emissores de CO2. A maioria dos veículos funcionam com petróleo. Há 800 milhões de automóveis no mundo. Segundo Soluções para a indústria de automoção, existem 253 milhões de automóveis e caminhões em uso nos EUA. Há 234 milhões de automóveis nas estradas da Europa Ocidental, num setor que emprega 13 milhões de pessoas.

Os relatórios da Union of Concerned Scientists apontam que a metade de todo o monóxido de carbono e óxido de nitrogênio e um quarto dos hidrocarbonetos aromáticos podem ser atribuídos aos transportes. A Union of Concerned Scientists assinala ainda que grande parte da contaminação poderia ser reduzida facilmente com as tecnologias de combustível para veículos limpos. Não é somente o uso de veículos que causa a contaminação. A UCS também destaca que, desde seu esboço, fabricação, até seu descarte, a contaminação relacionada com os veículos é significativa.

As emissões de CO2 globais da China correspondem ao dobro das emissões dos EUA. China igualou e superou as emissões dos EUA há mais de dez anos. As emissões da China se devem em grande parte ao uso de carbono e são desproporcionadamente maiores que as emissões dos EUA em decorrência do tamanho da população chinesa (1,3 bilhão de chineses em comparação com os 327 milhões de estadunidenses). Apesar de ter uma quarto da população da China, as emissões de CO2 per capita dos EUA são mais que o dobro das chinesas. O consumo de energia pessoal é um fator importante. O chinês médio utiliza 3500 kilowatts de energia por hora (kWh) em comparação com a média do estadunidense, que utiliza mais de 12 000. O transporte pessoal é outro fator. Em 2011, na China havia 68,9 veículos motorizados para cada 1000 pessoas. Nos EUA, eram 786 para 1000. Tenha-se em conta também o impacto do consumo de alimentos nas emissões. Em 2008, o consumo médio diário de calorias na China era de 2900. Nos EUA, era de 3750,8.

Quanto mais se ocidentalizam os países, mais provável é que contaminem. Na década de 1980, China aplicou programas de privatização ao estilo estadunidense, recebendo enormes fluxos de capital dos Estados Unidos. Em vinte anos, China igualou o nível de emissões anuais de CO2 dos EUA. Em 2000, as empresas investiam $11,14 bilhões na China. Em 2007, eram $ 29,71 bilhões. Daí saltou $ 53,93 bilhões em 2008 e subiu para $ 65.77 bilhões em 2014.

O Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) estima que a contaminação do ar mata 200 000 estadunidenses a cada ano. O Laboratório da Aviação e do Meio Ambiente do MIT realiza um acompanhamento das emissões no nível do solo, das chaminés industriais, veículos, ferrovias e calefação residencial. Somente as emissões de veículos de estrada matam outras 52 000. Califórnia tem a pior qualidade do ar: 21 000 pessoas morrem prematuramente a cada ano. Em média, o enxofre, o monóxido de carbono e outros contaminantes encurtam a vida dos afetados em uma década. Segundo os pesquisadores, os congestionamentos de tráfico são uma das razões de uma grande número de mortes relacionadas com os veículos. Quando os fluxos de tráfico transitam por zonas menos povoadas, o número de pessoas afetadas é menor. A contaminação comercial e privada foi mais alta na região central dos EUA, nas cidades industrializadas e se estende por Atlanta, Chicago, Detroit, Filadelfia e Los Ángeles.

Grande parte deste investimento é interna no marco das empresas estadunidenses, já que as empresas buscam mão de obra barata para externalizar para China e outros países pobres. Por exemplo, em 2010 a revista especializada Manufacturing and Technology News indicava que: “Centenas de grandes empresas estadunidenses estão deslocalizando milhares de postos de trabalho para o estrangeiro”, onde os direitos dos trabalhadores, a remuneração e as normas de saúde e segurança são menores. Alguns países estrangeiros oferecem grandes vantagens fiscais para o investimento estrangeiro direto. As grandes empresas e suas filiais e divisões deslocalizam para China, México e outros países pobres com baixos padrões ambientais, entre elas: AT & T, Boeing, General Dynamics, Hewlett Packard, IBM, International Paper, Kingston Technology, Motorola, Nordex, Rockwell Automation, Sony Pictures Imageworks, Staples, Tenneco Automotive e Tyco Electronics.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, 7 milhões de pessoas morrem a cada ano como resultado da exposição à contaminação do ar. Isso equivale a uma de cada oito mortes no mundo. A contaminação do ar é o maior risco para a saúde ambiental e supões mais que o dobro das estimativas prévias. A contaminação interior e exterior estão relacionados com o câncer, as enfermidades isquêmicas do coração (artérias) e os acidentes cerebrovasculares.  Os países pobres e menos desenvolvidos têm a pior qualidade do ar, com um ar particularmente tóxico no sul e no leste da Ásia e do Pacífico Ocidental. 3,3 milhões de mortes nessas regiões se atribuem à contaminação interior (incluindo a qualidade do ar relacionada com o trabalho) e 2,6 milhões à contaminação exterior.

Segundo a Dr. Flavia Bustreo, Vice-Diretora Geral de Sáude da Família, Mulheres e Crianças da OMS: “As mulheres e as crianças pobres pagam um alto preço pela contaminação do ar interior, já que passam mais tempo em casa respirando a fumaça e fuligem de carvão e de fogão de lenha”. O carvão é um contaminante particularmente mal, daí que seja a segunda causa principal de mortes relacionadas com a contaminação do ar nos EUA. O Dr. Carlos Dora, Coordenador da OMS para a Saúde Pública, Meio Ambiente e Determinantes Sociais da Saúde, sustenta: “a contaminação excessiva do ar é frequentemente um subproduto de políticas não-sustentáveis em setores como o transporte, a energia, a gestão de resíduos e a indústria”.

Os contaminantes que provocam a mudança climática antropogênica não somente são maus para a temperatura e o tempo, são também más para a saúde humana e animal. Mas não se deve perder a esperança. Há grandes e importantes mudanças graças a ativistas de base, como o movimento Extinction Rebellion, e a possibilidade de um Green New Deal no plano político. É preciso apoiá-los e ampliar sua ação.

[Este artigo é um excerto modificado do meu novo livro, Privatized Planet: “Free Trade” as a Weapon Against Democracy, Healthcare and the Environment (2019, New Internationalist).]

Entre os países mais pobres, os maiores contaminantes (Brasil, China e Índia) apresentam emissões per capita menores em comparação com as das nações “desenvolvidas”. O continente menos contaminante, de longe, é a África, sendo alguns dos países mais ocidentalizados (Argélia, Egito, Nigéria e África do Sul) os que emitem a maior parte de CO2. Também vale a pena recordar que os países pobres são provedores de recursos, incluindo petróleo e outras matérias-primas, para o Ocidente. As fábricas e instalações de de montagem, que utilizam uma grande quantidade de energia, contaminam porque produzem bens para a exportação para a Europa e América do Norte, sendo o transporte marítimo e aéreo grandes emissores de CO2. As exportações marítimas da Libéria, por exemplo, convertem-na num contaminante significativo.

Original: Counterpunch
Tradução: Charles Rosa