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FONTE: Correspondencia de Prensa | 07/08/2020 | TRADUÇÃO: Charles Rosa

A Corte Suprema de Justiça da Colômbia ordenou, em 4 de agosto, a detenção domiciliar do ex-presidente Álvaro Uribe Vélez. Ele é investigado por suposta fraude e suborno de testemunhos num processo vinculado a esquadrões paramilitares da ultradireita.

A situação carece de precedentes: nunca antes um tribunal colombiano havia ordenado a privação da liberdade de um ex-presidente. Entretanto, nos corredores e salas da Corte, decide-se se Uribe será acusado e se será levado a julgamento ou se, pelo contrário, o caso ficará, como costuma ocorrer, arquivado. Deve levar-se em conta que, além do que Uribe é o mentor do atual presidente colombiano, Iván Duque, exerce, ademais, como senador da república e é o líder indiscutível dos setores conservadores mais fundamentalistas num país ideologicamente muito polarizado.

As investigações judiciais e jornalísticas que envolvam Uribe com o paramilitarismo vêm de longe, desde suas origens como político local na capital antioquenha de Medellín, ainda que uma vez ou outra – por arte de magia – ficaram sistematicamente arquivadas. No caso da atual investigação, as supostas pressões exercidas por Uribe sobre as testemunhas se deram através de terceiros, quando o ex-mandatário era congressista depois de deixar a presidência.

Depois do anúncio público das medidas cautelares, os uribistas impulsionaram em Bogotá uma longa caravana de automóveis como demonstração de apoio a seu líder; em paralelo, panelas e buzinas fizeram-se notam em bairros populares e de classe média de muitas diversas urbes colombianas como celebração da ordem de prisão preventiva.

Os escândalos do presidente

Declarado inimigo do acordo de paz estabelecido com a insurgência, Uribe é hoje o líder principal do partido Centro Democrático. A organização é a base do apoio legislativo ao atual presidente, Iván Duque, que por estes dias busca aprofundar suas reformas de corte neoliberal no mercado de trabalho, aproveitando as condições sociais geradas pelo impacto da pandemia. Duque saiu imediatamente a defender seu padrinho político e disse crer em sua “inocência e honorabilidade”.

O certo é que, eleito presidente da Colômbia em 2002, o primeiro objetivo de Uribe foi modificar a Constituição – naquele momento a carta magna proibia os presidentes governar por mais de um mandato consecutivo – com o fim de poder ser reeleito em 2006. Aprovada a reforma, sairia posteriormente à luz pública que os operadores uribistas haviam conquistado o apoio de muitos parlamentares a tal reforma mediante o oferecimento de vantagens pessoais. Dois legisladores foram condenados por receber subornos e dois ex-ministros de Uribe se encontram na atualidade sob investigação por referido assunto.

Em paralelo, fruto do jornalismo de investigação, a revista Semana descobriu, em 2009, que durante as presidências de Uribe o Departamento administrativo de Segurança – o equivalente ao FBI na Colômbia utilizou seus agentes secretos e sua tecnologia para o controle ilegal de chamadas telefônicas e dos movimentos dos políticos opositores ao uribismo, assim como de ativistas de direitos humanos, jornalistas e, inclusive, juízes do Tribunal Supremo. Tudo isso por ordem direta do Palácio de Nariño.

De igual maneira, na atualidade o Tribunal Supremo investiga dezenas de parlamentares uribistas por supostos vínculos financeiros e políticos com grupos paramilitares da extrema-direita. Entre eles, não podia faltar Mario Uribe, um primo do ex-mandatário, que inclusive chegou a ser encarcerado em 2011 por seus laços com o paramilitarismo. Nos expedientes judiciais consta como os homens do ex-presidente Uribe ameaçaram e chantagearam os juízes para impedir sentenças condenatórias contra seus amigos e o entorno presidencial.


Mas, possivelmente, o mais grave dos assuntos que envolve ao duas vezes mandatários foi a forma na qual se cobriu com um espesso véu sobre as investigações internas que demonstravam como os militares colombianos assassinaram civis inocentes entre 2006 e 2010, e faziam passar os cadáveres como guerrilheiros abatidos. Os chamados “falsos positivos” remontam à década dos oitenta, mas ocorreram com maior frequência de 2004 a 2008 – durante o governo de Uribe-, segundo a Corte Penal Internacional, e ascenderam a, ao menos, 2.248, segundo estatísticas da Procuradoria-Geral da Colômbia.

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